04 junho 2018

Designer como facilitador

Contribuição dos estudos em dinâmica de grupo para atuação contemporânea do designer como facilitador

Contribution of the studies in the group's dynamics for the contemporary acting of the designer as a facilitator

Ricaldoni, T.

RESUMO: O presente artigo faz um cruzamento da temática da dinâmica de grupo com a atuação contemporânea do designer como facilitador. O objetivo dessa pesquisa é identificar se estudos em dinâmica de grupo podem trazer contribuições para a atuação do designer com pequenos grupos em sessões de codesign, design participativo, ou mesmo design thinking. Para tal, foi realizada uma revisão da literatura dos dois temas e analisados os pontos de convergência. Observa-se um grande potencial de colaboração entre as áreas, uma vez que os estudos em dinâmica de grupo trazem fundamentação teórica que direciona a atuação com grupos e orienta o papel de facilitador.

PALAVRAS CHAVE: Design; Facilitação; Dinâmica de grupo; Psicologia social.
ABSTRACT: This article is based on the intersections between group dynamics and the contemporary role of the designer as a facilitator. The purpose of this research is to identify if studies in group dynamics can contribute to the designer that works with small group sessions of codesign, participatory design, or even design thinking. In this study, a literature review of the two subjects was carried out and the convergence points analyzed. As a result, it is possible to observe a great collaboration potential between both areas, since the studies in group dynamics bring theoretical foundation that directs the development of group works and guides the role of the facilitator.

KEYWORDS: Design; Facilitation; Group dynamic; Social Psychology.

 


1. Introdução

A contemporaneidade é caracterizada por uma nova organização social, mais globalizada, tecnológica, dinâmica, desmaterializada e fluida do que as anteriores. Esse novo contexto tem ampliado a área de atuação do design, abrindo novas possibilidades de atuações para o profissional da área (KRUCKEN, 2008).

Uma dessas novas atividades dos designers, cada vez mais demandada, é a facilitação de grupos em sessões de codesign, design participativo, ou mesmo design thinking. Esses tipos de abordagens mais colaborativas do design ganharam destaque à medida que as atividades projetuais ficaram mais complexas e que os usuários passaram a permear todo o processo de design (PIIRAINEM, KOLFSCHOTEN & LUKOSC, 2009; SBORDONE, 2008).
Apesar dessa atuação do designer como facilitador estar se disseminando na contemporaneidade, no geral, essa prática não é acompanhada de um aprofundamento teórico que a fundamente. Nesse sentido, Moura, Bertoni e Silveira (2014) apontam que o currículo e a abordagem pedagógica do ensino em design estão defasados no país, sendo necessário que haja um questionamento sobre que profissionais as universidades buscam formar, “um desenhista industrial técnico ou um pensador sistêmico, reflexivo, crítico e capaz de contribuir para a cocriação de um futuro sustentável?” (p. 1).
Por outro lado, a Psicologia Social, especificamente no ramo da dinâmica de grupo, tem se dedicado a estudar profundamente os fenômenos que envolvem pequenos grupos e a criar direcionamentos para o profissional que desempenha o papel facilitador deles (RAMALHO, 2010). Nota-se, portanto, o potencial do design se aproximar mais dos conhecimentos interdisciplinares da dinâmica de grupo, a fim de enriquecer e fundamentar sua prática com pequenos grupos.
Desse modo, este artigo apresenta uma revisão da literatura sobre a atuação do design na contemporaneidade, assim como algumas contribuições teóricas dos estudos em dinâmicas de grupos, buscando uma sobreposição entre as áreas.

2. Metodologia

O presente artigo tem como objetivo principal identificar se os estudos em dinâmica de grupo da psicologia social podem trazer contribuições para a atuação contemporânea do designer como facilitador. Para tal, reúne informações de dois campos diversos do saber: o design e a psicologia social. Assim, o estudo busca também iniciar um debate sobre interseções entre essas áreas.https://ssl.gstatic.com/ui/v1/icons/mail/images/cleardot.gif
De acordo com Silva e Menezes (2005), trata-se de uma pesquisa básica, que busca contribuir com o avanço científico teórico. O estudo tem uma abordagem qualitativa, por realizar uma análise aprofundada e subjetiva das informações encontradas. Em relação aos objetivos, é uma pesquisa exploratória (GIL,1991) que visa uma familiaridade com as áreas de conhecimento, baseada na revisão da literatura do tipo narrativa.
A partir da hipótese que os estudos em dinâmica de grupo podem contribuir com a atuação contemporânea do designer, foi feito um levantamento de estudos correlacionados na base de periódicos da Capes. Os estudos foram selecionados pela pesquisadora tendo como critério o potencial de colaboração com o objetivo de pesquisa proposto. Esses foram analisados, buscando interseções entres as áreas pesquisadas e os resultados encontrados compilados nesse artigo.

3. Revisão da literatura

3.1 Atuação contemporânea do design

A transição do século XX para o século XXI foi marcada por transformações tecnológicas, descobertas científicas, desenvolvimento exponencial e pela globalização, modificando a estrutura da sociedade (SEVCENKO, 2001). Este novo contexto mundial, chamado de pós-industrial, se estabelece como extremamente dinâmico, desmaterializado e fluido (KRUCKEN, 2008). O que impactou a cultura material das sociedades, alterando a forma como os profissionais do design atuam (BELCHIOR & RIBEIRO, 2013).
Esse novo cenário expande a complexidade da prática do design e seu raio de atuação (MORAES, 2008). Nota-se que essa ampliação do escopo do design fez o foco dos profissionais da área transitarem dos produtos para uma perspectiva sistêmica. Assim, o desafio do design na contemporaneidade é desenvolver soluções para problemas complexos, o que demanda uma visão ampla do projeto, incluindo produtos, serviços, comunicação, entre outros (KRUCKEN, 2008).
De acordo com Bertola (2004), as mudanças na natureza dos projetos levaram a uma modificação da prática profissional do design e no modo de conduzi-los. Santos (2014) aponta que o design além de lidar com questões técnicas, passou a incluir nos projetos, novos aspectos sociais, culturais, ambientais, políticos, e analisar a sobreposição entre eles.
Assim, pode-se afirmar que as mudanças da sociedade transformaram o design, tornando-o menos tecnicista e linear e mais próximo de áreas que estudam o comportamento humano e codificam atributos intangíveis (MORAES, 2011). Nesse sentido, Thackara (2008) aponta que o design em um mundo complexo modifica seus paradigmas e deixa de ser sinônimo de projeto para ser visto como um serviço que pode ser aplicado aos mais diversos contextos.
Além disso, o design não projeta mais para a sociedade, e sim com ela, criando formas colaborativas de desenvolvimento (THACKARA, 2008). A colaboração tem ganhado destaque no design à medida que as atividades projetuais se tornam cada vez mais complexas, de forma que não é mais viável, nem desejável, que um único profissional domine todos os conhecimentos e habilidades demandados em um projeto (PIIRAINEM; KOLFSCHOTEN & LUKOSC, 2009). A perspectiva de colaboração no processo de design foi disseminada por correntes da área, como o design centrado no usuário, design centrado no humano, design participativo e codesign.
O design centrado no usuário, como sugere o termo, tem como princípio colocar o usuário como foco principal do processo de desenvolvimento (SAVI; SOUZA, 2015). Se antes os testes com usuários figuravam apenas nas últimas etapas do processo do design, agora estão presentes desde o início, aumentando o entendimento das suas necessidades, desejos, pensamentos e sentimentos (SBORDONE, 2008).
Na abordagem mais específica do design centrado no humano, o foco é o desenvolvimento de projetos que se preocupem com o bem-estar físico e psicológico dos seres humanos (SBORDONE, 2008). O guia Human Centered Design (HCD - Design Centrado no Ser Humano), construído com base em experiências práticas da empresa IDEO, apresenta um processo marcado pela inclusão e aproximação das pessoas, partindo da identificação de desejos do usuário, e depois integrando os aspectos práticos e de viabilidade do projeto (IDEO, 2011).
Segundo Sanders e Stappers (2008) o design participativo se baseia na participação ativa do usuário ao longo de todo o processo de design. Um conceito mais recente, o codesign, pode ser considerado um sinônimo da prática do design participativo. Baseado no conceito de cocriação, o codesign é basicamente um processo criativo de desenvolvimento de projetos no qual designers e pessoas não treinadas em design trabalham juntas. Entretanto Langley (2016) aponta que há diferença entre os termos. Para ele no codesign a propriedade e gerenciamento do projeto ainda é dos designers, mesmo existindo exercícios participativos. Por outro lado, no design participativo, o designer assume o papel de facilitação e condução, auxiliando o grupo a levantar problemas com os quais convivem e buscar soluções para tais, de forma que o grupo é autor dos processos e resultados (LANGLEY, 2016; SANDERS & STAPPERS, 2008).
Principalmente nessas correntes do design, e cada vez mais em toda a prática da área, são comuns oficinas de aplicação de ferramentas de design com grupos de usuários, não treinados em design. Essas oficinas podem ter diversos objetivos e acontecer em diversas fases do projeto, seja compreender as necessidades dos usuários, levantar ideias, ou mesmo testar protótipos.
Além disso, na perspectiva de ampliação da área, o design tem subido do nível operacional para o nível estratégico das organizações (MOZOTA, 2003). A ideia de compreender o modo de pensar do design e o difundir para diversos profissionais e aplicações, deu origem a uma corrente chamada de Design Thinking (BROWN, 2009). Segundo Bjögvinsson e Hillgren (2012), esta é apenas uma nova roupagem para o clássico design participativo, porém mais articulada, atraente e acessível a não designers. De todo modo, o Design Thinking se disseminou, sendo aplicado em negócios, organizações e projetos, e caracterizado, principalmente, pelas seções de cocriação em grupo, uso de post-its e de ferramentas típicas da área do design.
Ademais, o design passou a ser reconhecido por sua capacidade de promover desenvolvimento local. Nesses projetos o designer busca fortalecer o território em contraponto à cultura da globalização, desenvolvendo projetos com recursos da região, e os valorizando (KRUCKEN, 2008).
Um exemplo prático do design atrelado ao território, comum no Brasil, é a atuação de designers em grupos de artesãos. Essa atuação foi fomentada por políticas públicas desde a década de 1990 e pela realização de projetos de extensão e pesquisa de universidades, como o 'Programa Minas Raízes – Artesanato, Cultura e Design Social' da Escola de Design da Universidade do Estado de Minas Gerais e o Núcleo de Abordagem Sistêmica do Design (NASDESIGN) da Universidade Federal de Santa Catarina. Ambos projetos universitários trabalham junto às comunidades criativas, especialmente grupos de artesãos, os capacitando, empoderando e conduzindo um processo de criação de peças de artesanato com aplicação de ferramentas e princípios de design. Nesse contexto os designers atuam como facilitadores para promover o desenvolvimento e a expressão da capacidade dos artesãos (PRESTES & FIGUEIREDO, 2011; RIOS et. al., 2010).
Durante todo esse subtítulo, nota-se que, sem dúvidas, a atuação do designer ao longo da história transitou da função de “autores individuais de objetos, ou construções, a facilitadores de mudança entre grandes grupos de pessoas” (THACKARA, 2008, p. 21).

3.2 A Dinâmica de Grupo na Psicologia Social

A partir do século XIX a psicologia começou a desenvolver o ramo da Psicologia Social por meio dos estudos da Psicologia das Massas, também chamada de Psicologia das Multidões, que buscavam entender fenômenos coletivos, como a Revolução Francesa. Ao longo do tempo, a Psicologia Social se aprofundou no funcionamento dos grupos, surgindo também estudos sobre grupos menores (AMARAL, 2007; PINHEIRO, 2014).
Na área da Psicologia Social, os grupos são entendidos como uma unidade que se forma quando dois ou mais indivíduos estão ligados, por tempo, espaço físico e/ou psicossocial, possuindo normas e objetivos comuns. A diferença entre grupo e agrupamento é a existência de um vínculo entre os membros e a interação e interdependência entre eles para a realização de uma tarefa. Além disso, os grupos são mais que a soma dos seus componentes e não são entidades estáticas, e sim um fenômeno em constante mutação (AMARAL, 2007; ZIMERMAN, 2000; RAMALHO, 2010; RIVIÉRE, 1998).
Principalmente após a metade do século XIX, diversos pensadores, influenciados pelo cenário do final da Segunda Guerra Mundial, desenvolveram teorias que tinham como foco os grupos. Neste contexto, a expressão ‘dinâmica de grupo’ surgiu no meio científico em 1944, cunhada pelo pesquisador Kurt Lewin em um estudo que correlacionava a teoria e a prática da Psicologia Social (RAMALHO, 2010).
As pesquisas de Lewin foram pioneiras na aplicação de uma ciência experimental em pequenos grupos. Ele acreditava que a pesquisa em Psicologia Social deveria buscar resolver problemas sociais reais, por meio da ação social, por isso, desenvolveu uma metodologia própria de pesquisa, a pesquisa-ação (RAMALHO, 2010; AFONSO, 2006; LEWIN, 1978). Nota-se que este tipo de metodologia é utilizado com certa regularidade na pesquisa em design, já apontando uma sobreposição entre as áreas.
Jacob Levy Moreno foi outro pesquisador pioneiro que trouxe contribuições aos estudos sobre dinâmica de grupo. Moreno se dedicou a observar as inter-relações existentes nos grupos e sua pesquisa culminou no desenvolvimento do psicodrama, técnica de psicoterapia em pequenos grupos baseada na representação dramática, que utiliza a ação lúdica para gerar resultados (SEMINOTTI, 1997; RAMALHO, 2010; VITIELLO, 1997).
Além de Lewin e Moreno, outros pensadores contribuíram para o desenvolvimento do estudo em dinâmica de grupo, entre eles destaca-se Carl Rogers, criador dos grupos de encontro, e Pichon Rivière, que desenvolveu a teoria dos grupos operativos, levantando diretrizes para que o trabalho em grupo seja focado em resultados (RAMALHO, 2010; AMARAL, 2007).
A dinâmica de grupo é um ramo da psicologia social que estuda os pequenos grupos, analisando sua natureza, estrutura, funcionamento, fenômenos e princípios. Essa área de pesquisa é ampla e relevante, uma vez que o ser humano tem como característica se reunir em grupos sociais e, por isso, usualmente passa a maior parte da sua vida interagindo com diversos grupos (MAILHIOT, 1991).
Desta forma, a dinâmica de grupo é uma ciência interdisciplinar que beneficia muitas áreas de conhecimento com suas pesquisas e é aplicada em contextos variados. As áreas de conhecimento que mais pesquisam e aplicam dinâmicas de grupo são: a saúde, principalmente em projetos relacionados a psicoterapias de grupo; a educação, realizando pedagogias de grupo que promovem o aprendizado juntamente com a socialização; o serviço social, que a utiliza especialmente em projetos voltados a grupos vulneráveis; e a administração, focando a gestão de pessoas, otimização dos grupos de trabalho e relações organizacionais (PEGORINI, 2012; VITIELLO, 1997). Nesse sentido, nota-se um potencial do design de se aproximar mais dos conhecimentos interdisciplinares da dinâmica de grupo, já que na contemporaneidade atua, cada vez mais, com pequenos grupos.
As pesquisas em dinâmica de grupos geram contribuições que fundamentam, direcionam e otimizam atividades práticas com pequenos grupos (PEGORINI, 2012). Assim, apresenta-se neste artigo algumas contribuições teóricas dos estudos em dinâmicas de grupos da psicologia social que servem como uma amostra do potencial que essa área tem para balizar a atuação dos designers como facilitadores.
Antes de iniciar um trabalho que aplique a dinâmica de grupo, é importante entender que a formação de um grupo sempre gera resistência, pois há um medo, inerente e implícito, do desconhecido. Por isso, é indicado que haja um alinhamento, no qual os membros compreendam que tarefa será realizada pelo grupo, como ela será conduzida, e quais necessidades e interesses particulares os leva a ingressar no grupo (RIVIÈRE, 1988).
Um grupo é composto por membros que mantém sua individualidade, mas que são influenciados pelo modo como o grupo reage à sua pessoa. Estes também são influenciados pelo sentimento dominante do grupo naquele momento e pelo ambiente físico em que estão alocados, criando uma atmosfera mais formal ou informal, amistosa ou ríspida, etc. Neste caso, é indicado criar uma atmosfera menos autoritária, em que todos se sintam livres, favorecendo a participação (RAMALHO, 2010).
Além da sua individualidade, cada membro leva para o grupo seu repertório, que é confrontado com o dos demais durante as interações, tanto no nível operacional, como no socioemocional. Quanto mais a atmosfera do grupo propicia a participação e evita a criação de relações estereotipadas, mais ocorre uma revisão das verdades internalizadas e a elaboração de conhecimentos. Essa forma de gerar aprendizado é mais dinâmica, o indivíduo é mais ativo e consciente (RAMALHO, 2010). Portanto, atividades em pequenos grupos são indicadas para projetos com objetivo de gerar aprendizado e empoderamento, como é o caso de algumas atuações do design, principalmente em contexto social, como com comunidades criativas e de artesãos.
Apesar da essência dos fenômenos grupais serem similares para qualquer grupo, eles são diversos de acordo com a sua finalidade, contexto, tamanho e características do grupo, por exemplo a faixa etária dos participantes. Essas diferenças devem ser identificadas para otimizar o trabalho com o grupo e mapear as contribuições teóricas. Desse modo, a variedade de aplicações da dinâmica grupal é ampliada, combinando técnicas e táticas de áreas afins e contextos diversos (ZIMERMAN & OSORIO, 1997; PINHEIRO, 2014).
As técnicas de grupo são padrões, formais ou informais, que constroem condições melhores para que as interações nos grupos sejam efetivas e os objetivos sejam alcançados. Existem técnicas específicas para aquecer e desbloquear o grupo, para conciliar conflitos, extrair feedbacks, entre outras (VITIELLO, 1997). Algumas técnicas simples podem, por exemplo, melhorar a atmosfera do grupo, como fazer com que os membros se chamem pelo nome (RAMALHO, 2010).
Independentemente do tipo de grupo e técnicas utilizadas, ele sempre é influenciado por forças externas e internas, e pode assumir algumas modalidades emocionais ao logo do trabalho, que podem auxiliar ou atrapalhar a interação. Algumas modalidades que devem ser evitadas, por exemplo: a modalidade de dependência, caracterizada por um constante pedido de apoio e necessidade de autoridade externa; a modalidade de luta, identificada pela agressividade, hostilidade e depreciação do grupo; e a modalidade de fuga, em que os membros diminuem o envolvimento, permanecem em silêncio ou fogem do tema proposto (MOSCOVICI, 1998). Nota-se que o entendimento dessas modalidades pode favorecer o trabalho do designer como facilitador, que na sua atividade prática terá mais habilidade para contornar situações adversas.
Além das modalidades emocionais, são identificados também alguns papéis que os membros podem assumir dentro de um grupo. Há papéis instituídos dentro do grupo, como o de coordenador, observador e membro, e papéis não instituídos. Alguns papéis não instituídos comuns em grupos são: o porta-voz, aquele que verbaliza o que está implícito no grupo; o bode expiatório, quem expressa o que é negado pelo grupo e é apontado pelos outros membros como culpado pelos fracassos; o sabotador, que desvia o grupo da tarefa; e o líder da tarefa, que motiva o grupo a realizar a tarefa (GAYOTTO, 2001). O entendimento dos papéis também é de grande valia para a atuação direta com grupos.
Um papel instituído muito importante para o funcionamento dos grupos é o de coordenador das dinâmicas de grupo, ou seja, o responsável por guiar e conduzir o grupo na execução de sua tarefa e durante as oficinas (MOTA, 2006). Segundo Pegorini (2012), o termo mais adequado para denominar esse profissional seria facilitador. Esse profissional deve ter um papel ativo de facilitar o processo do grupo, e não intrusivo, não cabendo a ele a postura de quem detém o saber ou decide pelo grupo (AFONSO, 2006). Nota-se que esse papel é muitas vezes assumido pelos designers nas oficinas de codesign, design participativo e design thinking.
Pegorini (2012) também afirma que para assumir esse papel de facilitador o profissional deve ser humana e tecnicamente preparado. Nesse sentido, Mota (2006) aponta que para ser um bom coordenador de grupos é preciso conhecer profundamente as pesquisas sobre grupos. Corroborando com essa ideia, Ramalho (2010) defende que para ocupar esse papel é preciso conhecer as técnicas de dinâmicas de grupo, suas limitações, e a natureza do grupo trabalhado. Esses apontamentos mostram a importância de designers que atuam como facilitadores de grupos se aproximarem dos estudos sobre dinâmica de grupo, principalmente os que visam treinar profissionais para o papel de coordenador de grupos.
Segundo Zimerman e Osório (1997), para assumir o papel de facilitador de um grupo é crucial ter boas habilidades interpessoais, como flexibilidade, respeito, paciência, comunicação, empatia, capacidade de dar e receber feedbacks, poder de síntese e integração. As competências de um coordenador de grupo devem envolver também a responsabilidade ética e a ausência de preconceitos (MOTA, 2006). As características para esse papel podem ser aperfeiçoadas em cursos, pesquisas de aprofundamento na teoria, porém, por ser uma atividade prática, a maior parte dos atributos se desenvolve por meio das experiências nos grupos e trajetória de vida (PINHEIRO, 2014).
Ser coordenador de um grupo exige do profissional um equilíbrio entre seu lado profissional e pessoal. Desse modo, ele deve evitar se expor de maneira excessiva, física e emocionalmente para o grupo, e poupar os demais membros de suas dúvidas, críticas, frustações e dificuldades. Por outro lado, é indicado que o facilitador crie vínculos com o grupo, mas esses laços devem ser limitados para evitar que seja criada uma atmosfera de dependência (MOTA, 2006).
Segundo Amaral (2007), para que o coordenador selecione uma técnica coerente a ser aplicada com o grupo é importante ficar atento a seis quesitos: objetivo, ter clareza do que quer com a aplicação da técnica; ambiente, analisar se o espaço é adequado para a técnica; duração, estabelecer tempo necessário a aplicação da técnica; número de participantes, verificar se a técnica é coerente com a quantidade de pessoas; materiais, levantar todos os recursos necessários para aplicação; e conclusão, planejar um momento de análise e reflexão após a técnica.
Durante o planejamento de uma ação com um grupo é importante que o coordenador passe por quatro momentos: a demanda, quando se entende as necessidades e realidade do grupo, fazendo um diagnóstico; a pré-análise, momento de buscar embasamento, informações e dados; o enquadramento e foco, momento de tomada de decisão sobre o formato de trabalho com o grupo, decidindo itens como número de encontros, estrutura necessária, quantidade e tipos de participantes; e o planejamento flexível, criação de um planejamento a cada encontro com o grupo, preparando a ação e buscando antecipar as possíveis situações que serão encontradas. Apesar da estruturação dos encontros variar bastante, é indicado que cada um perpasse por três momentos: momento de preparação, momento de envolvimento e momento de sistematização (AFONSO, 2006).
O planejamento do coordenador deve ser detalhado e cuidadoso, mas, acima de tudo, ser adaptado para grupo com o qual irá se trabalhar. Mesmo assim, o planejamento deve ser flexível, e o coordenador não deve ter medo de alterá-lo, de acordo com as demandas e reações do grupo durante o processo. Nesse sentido, o coordenador atento deve observar as dimensões conscientes e inconscientes, reparando nas manifestações verbais e corporais dos participantes (MOTA, 2006; AFONSO, 2006).
Observa-se que o coordenador do grupo assume o papel de líder instituído do grupo (PINHEIRO, 2014). Essa liderança pode ser compartilhada com outras forças internas no grupo, uma vez que a liderança é um fenômeno emergente, situacional e fruto da interação (RAMALHO, 2010). Segundo Lewin (1978), a liderança democrática torna o grupo menos dependente do líder, com bons resultados a longo prazo, já a autocrática tem bons resultados em curto prazo, que se perdem com a ausência do líder.
De todo modo, o coordenador deve evitar comandar de maneira diretiva o grupo, por exemplo, distinguindo o que cada pessoa deve fazer. Assim como, evitar expor sua opinião, crenças e julgamentos ao grupo (MOTA, 2006).

4. Conclusões

Ao pesquisar a atuação contemporânea do design e os estudos em dinâmica de grupo, observa-se que há interseção entre as áreas. O designer na contemporaneidade tem assumido o papel de facilitador de pequenos grupos, fenômeno que é o próprio objeto de estudo desse ramo da Psicologia Social. Embora a Psicologia Social usualmente estude o fenômeno de grupos em outros contextos, como a psicoterapia em grupo ou ensino de adultos, a natureza, estrutura e funcionamento desses pequenos grupos têm similaridade com os grupos conduzidos por designers. Isso torna as contribuições da área válidas para enriquecer e fundamentar a prática dos designers como facilitadores.
Existem várias produções acadêmicas em dinâmicas de grupo que buscam direcionar o trabalho com grupos, tornar as oficinas de grupo mais eficientes e, inclusive, orientar o facilitador para sua atuação no grupo. Possivelmente, essas são as principais contribuições da Psicologia Social para a atuação do designer como facilitador. Destacam-se, como uma amostra dessas contribuições, as indicações para o facilitador: conhecer técnicas para aquecimento, conciliar conflitos e extrair feedbacks; desenvolver habilidades interpessoais; reconhecer as características do grupo de atuação; definir técnicas de acordo com grupo, ambiente, materiais e tempo disponível; ter um planejamento flexível; realizar um alinhamento no início das atividades; criar uma atmosfera menos autoritária; identificar a modalidade emocional do grupo e os papéis assumidos.
Portanto, nota-se um grande potencial de contribuição dos estudos em dinâmica de grupo para o design contemporâneo. Como ambas as áreas são caracteristicamente interdisciplinares, a ponte entre esses saberes se torna ainda mais natural e desejável. Além disso, esta contribuição é de extrema importância, uma vez que, atualmente, um designer que atua como facilitador tem seu conhecimento mais baseado na sua própria prática, do que apoiado em uma base teórica. Pode-se dizer que a preparação do profissional para a atividade com pequenos grupos no design é praticamente nula. Os designers têm conhecimento das ferramentas e metodologias de design que aplicam com os grupos, mas não têm sobre como lidar com os fenômenos que envolvem um grupo em si.
Esses apontamentos levantam uma questão: a formação acadêmica do design atual fornece subsídio, teórico e prático, para que os alunos desenvolvam as habilidades e conhecimentos necessários para atuarem como facilitadores? Partindo desse questionamento, sugere-se que pesquisas futuras estudem a possibilidade de incluir conhecimentos em dinâmica de grupo na formação dos designers. Seja por meio de cursos de formação complementar, da inserção desse conteúdo em disciplinas já existentes na grade da educação superior, ou mesmo, com a implementação de uma aula de facilitação.

 Referências

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Artigo extraído de Revista Convergências

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