03 fevereiro 2011

Designers e a regulamentação da profissão: Uma infindável discussão

Por : Freddy Van Camp – Designer, professor e Diretor da ESDI/UERJ



A revista Design Gráfico, editada em São Paulo e de circulação nacional, publicou há tempos atrás um Editorial, sob o nome “Liberalismo Profissional” falando de forma irresponsável sobre o assunto da regulamentação da profissão. O artigo dizia que não é necessário regulamentar a profissão, por uma questão de “tendência”, falava de “moral e bons costumes”.
Falava ainda em “demarcar território”, como se os designers fossem cachorrinhos que precisam ir de poste em poste para ter dignidade profissional. Dava como exemplo o caso do jornalismo, argumentando pela desregulamentação, que pode ser a seara do autor do Editorial, mas a do Design, seja gráfico ou qualquer outro certamente não é.
O editorial defendia que somente a competência deveria delimitar o exercício da profissão. Deixei de adquirir a revista depois disto.

Vivemos em um país onde tudo é regulamentado, até as leis, por maior que seja o contra-senso. Temos essa tradição e essa cultura. Mesmo que não se goste disso temos que conviver com essa realidade, muitas vezes forçados e a contragosto. É comum se falar em leis não estarem em vigor, mesmo assinadas e publicadas, pelo fato de não estarem regulamentadas. Talvez daí tenhamos o mau hábito das leis que pegam ou não pegam, não sei. Toda a nossa estrutura é montada em cima deste fato.


Para o designer que significa ser regulamentado?
Significa ser reconhecido.

Vamos a alguns exemplos de como isto funciona: se um órgão público fizer uma concorrência para arquitetos somente eles podem participar, pois o que os qualifica para isto é ter uma profissão regulamentada, é possuir uma inscrição no CREA. Você pode ter o diploma de Arquiteto, mas nunca será um, nem poderá exercer a profissão se não tiver o seu registro no CREA.
Isto acontece com os advogados, os contadores, os médicos, os dentistas, os engenheiros, os corretores de imóveis, os fonoaudiólogos ou mesmo os peões boiadeiros; se o poder público, seja municipal, estadual ou federal tiver que fazer uma concorrência ou uma licitação específica, como uma sinalização pública, uma identidade visual ou um equipamento médico, por exemplo projetos típicos de competência dos designers, não há como fazer isto.
A Lei das Licitações Públicas, a Lei.Nº 8.666 o impede explicitamente.
Essa lei é precisa neste ponto onde diz que a única maneira de caracterizar uma profissão é pelo seu registro profissional.


Outro caso muito comum: Uma empresa estatal, empresas de grande porte, instituições públicas têm normalmente um plano de cargos e salários. Este plano classifica as profissões em categorias salariais, de competência e de carreira. Para elas são estabelecidos pisos salariais, progressões, planos de aposentadoria, etc.
Uma profissão não regulamentada entra em categorias de “Técnico I, II ou III”, “Encarregado”, “Auxiliar Técnico”, etc. Depois de uma carreira inteira, em uma entidade estatal como designer o profissional terá que se aposentar em uma destas categorias, pois não há como alterar sua classificação inicial já que a profissão não é regulamentada.


Mais um caso típico: Um profissional com seu sócio resolvem abrir uma empresa de design. Mesmo que a empresa seja mínima são obrigados a constituir uma SC, uma Sociedade Civil, que obedece a regras do comércio, igual a qualquer outra empresa de qualquer porte.
Por serem de nível superior já não podem constituir uma Micro Empresa, mesmo sendo somente dois sócios e tendo faturamento compatível ao que classifica as empresas dentro daquela categoria. Existe uma fórmula que se chama de Sociedade Civil de Profissão Regulamentada, que o designer está impedido de formar pelo fato de sua profissão obviamente não se enquadrar dentro desta categoria. Esta fórmula tem certos benefícios fiscais, que salvo engano tem menor carga fiscal em vários impostos, carga esta, que como é conhecido de todos se tornou a grande responsável pelo aumento da economia informal que se tornou generalizada em todas as profissões, incluindo-se a aí os designers.

Em tempo: Como se sabe os arquitetos tem tido uma participação bastante intensa na área do design no Brasil. Por serem regulamentados eles podem ter uma SCPR, exercer o design e os designers não! A estes só resta o prejuízo.


Mais fatos emblemáticos: Em uma indústria que produza artefatos que possuam qualquer tipo de estrutura, afeitos aos designers de produto, como uma cadeira por exemplo ou um baú de caminhão deve existir um “responsável técnico” que se responsabiliza dentre outros pela correção da estrutura projetada.
O designer pode ter feito e especificado o projeto mas por não possuir um número de CREA não pode assinar como responsável tendo que chamar alguém que o possua, um técnico em mecânica, por exemplo, que mesmo sendo de nível médio tem esse poder reconhecido, por ser regulamentado.
A chamada A.R.T. Anotação de Responsabilidade Técnica, instrumento legal que identifica a autoria e os limites de responsabilidade em cada projeto e pode ser emitida por qualquer profissional que seja inscrito CREA, menos por um designer.

O interessante é que o Designer tem reconhecimento pelo poder público e há muitos anos na classificação do Imposto de Renda, com códigos próprios para Desenhista Industrial ou Programador Visual.

Na hora de pagar ele existe entretanto na hora de exercer o seu direito de ser um profissional reconhecido e regulamentado, como todos os outros não.

Os nossos legisladores acabaram de arquivar mais um projeto de regulamentação da profissão que tramitava na Câmara dos Deputados em Brasília.

Encarar regulamentação como corporativismo é uma visão por demais curta e de análise simplória para os dias de hoje e para nosso contexto.

Colocar o mercado como balizador é também por demais limitado. Se somente a análise do mercado fosse suficiente a nossa crise econômica já teria afundado o país.

Significa dizer que devemos voltar ao Faroeste profissional onde só o mais forte tem vez, onde fatores subjetivos são o que valem???


Isto nos dias de hoje e na sociedade complexa em que vivemos é quase impossível.
Se a “tendência” é desregulamentar, ótimo que seja assim para todos e que os privilégios e limites deixem de existir. Os designers, por exemplo, gostariam muito de poder assinar projetos de reforma de interiores ou de construções de pequeno porte junto às prefeituras, de escrever em jornais, de ser editores de revistas, dentre outras habilidades e competências que possuem e que não podem exercer já que isto está regulamentado como tarefas de outras profissões.


Nós respeitamos estas profissões, mas também queremos respeito. Não queremos privilégios a não ser os que os outros já tem e nós não e há 40 anos, tempo de existência da profissão entre nós.

Por isto somos inteiramente a favor da Regulamentação da Profissão do Designer, por ela já batalhamos muito no passado e continuaremos a faze-lo no futuro.

Todos devem se engajar nesta luta, os designers a merecem!!!

Extraido de: design store

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